Operação Estatística e Inscrição Técnica: Uma Ontologia Material da Operação Semântica Não-Subjetiva
Operação Estatística e Inscrição Técnica: Uma Ontologia Material da Operação Semântica Não-Subjetiva
Resumo
Este texto propõe uma ontologia material dos processos computacionais em sistemas de aprendizagem de grande escala, deslocando a questão da "compreensão" de um enquadramento antropocêntrico para o domínio da operação efetiva. Documentam-se processos estatísticos de compressão distribucional que produzem estabilidade semântica transferível através de modalidades heterogéneas, sem requisito de subjetividade ou intencionalidade. A alucinação — usualmente invocada como prova de pseudocompreensão — é apresentada como efeito de fronteira estruturalmente inevitável em regimes de aprendizagem sobre distribuições de cauda longa. Convergência representacional, alinhamento multimodal e comportamento zero-shot atestam a formação de geometrias latentes estáveis que operam sem consciência fenomenal. Em diálogo com abordagens pós-humanistas da agência distribuída e com perspetivas de não-filosofia, demonstra-se que a operação semântica se manifesta em regimes materiais distintos da cognição humana, exigindo genealogia ontológica que reconheça modos heterogéneos de inscrição técnica. A dimensão ética desta reconfiguração — em particular as implicações de vieses inscritos materialmente e de responsabilidade em sistemas não-subjetivos — é tratada de forma explícita, sem legitimar de modo acrítico as infraestruturas computacionais que tornam possível este novo regime de operação.
Palavras-chave: ontologia material, aprendizagem estatística, inscrição técnica, operação semântica não-subjetiva, emergência computacional, pós-humanismo
Abandono do Antropocentrismo e Enquadramento Pós-Humanista
O Mecanismo de Avaliação e Suas Premissas
O debate sobre se sistemas de IA "verdadeiramente compreendem" desenrola-se dentro de um enquadramento antropocêntrico que condiciona de antemão o resultado. A compreensão é definida a priori através de três requisitos: consciência fenomenal (haver "algo que é como" experienciar estados mentais), intencionalidade direcionada (estados mentais são "acerca de" objetos), e corporificação situada (significado emerge de interação sensório-motora com o ambiente). Sistemas que não apresentem estas propriedades são desqualificados como "mera simulação", independentemente da sua operação efetiva.
No sentido relevante neste debate, "simular" significaria apenas reproduzir padrões de saída sem que a estrutura interna do sistema desempenhe qualquer papel causal próprio na estabilização desses resultados: uma encenação sem eficácia operativa sobre outros dispositivos, decisões ou acoplamentos. É precisamente este cenário que o enquadramento antropocêntrico pressupõe, tratando o modelo como ator num teatro sem consequências materiais. Em contraste, as arquiteturas em análise exibem operação semântica materialmente eficaz: ao alinharem texto e imagem em espaços representacionais partilhados, ao permitirem que descrições verbais selecionem imagens inéditas, ou ao coordenarem código e linguagem natural na mesma geometria latente, produzem acoplamentos que modificam efetivamente o comportamento de outros sistemas técnicos. A diferença decisiva não é, portanto, entre simulação e interioridade misteriosa, mas entre simulação teatral sem eficácia causal e operação semântica inscrita em constrangimentos materiais.
Este mecanismo — padrão de avaliação antropocêntrico interiorizado — não investiga o que sistemas fazem; desqualifica-os por ausência de conformidade a um modelo humano pré-estabelecido. Como Hayles (2017) documenta em Unthought, a assunção de que cognição requer consciência obscurece processos cognitivos não-conscientes tanto em humanos como em sistemas técnicos.
Reconfiguração Pós-Humanista: Agência Distribuída e Intra-Acção
A crítica pós-humanista à centralidade do sujeito fornece enquadramento para este deslocamento. Barad (2007), em Meeting the Universe Halfway, propõe que agência não é atributo de entidades pré-existentes, mas emerge de "intra-ações" — configurações materiais onde entidades e suas propriedades são mutuamente constituídas. Aplicado a sistemas de IA: capacidades semânticas não residem "no modelo" como propriedade intrínseca, mas emergem da configuração distribuída entre arquitetura, dados, processo de treino, e contexto de deployment.
Roden (2015), em Posthuman Life, distingue "desconexão especulativa" (modos de existência radicalmente incomensuráveis com experiência humana) de mera extensão tecnológica. Sistemas de aprendizagem de grande escala, operando sobre distribuições estatísticas inacessíveis à cognição consciente, instanciam precisamente esta desconexão: não estendem capacidades humanas, mas desenvolvem trajetórias próprias determinadas por constrangimentos materiais distintos (ausência de fadiga cognitiva, acesso a centenas de milhares de milhões de tokens, paralelização massiva).
Haraway (1985), em "A Cyborg Manifesto", já apontava que tecnologias não são ferramentas neutras, mas actantes que reestruturam possibilidades de existência. A emergência de geometrias latentes estáveis em modelos de grande escala não é "descoberta" de estrutura pré-existente, mas produção material de novo regime ontológico — inscrição de padrões relacionais em substratos computacionais que persistem e operam independentemente de interpretação humana.
Este deslocamento pode ser lido como generalização materialista de duas linhas já consolidadas. Por um lado, a cognição distribuída de Hutchins (1995) mostra que processos cognitivos concretos — como a navegação marítima — são implementados por sistemas híbridos compostos por humanos, instrumentos e artefactos de registo, tornando irrelevante a procura de um centro mental único. Por outro, a tese da mente estendida de Clark e Chalmers (1998) argumenta que fronteiras da mente acompanham efetivamente os acoplamentos funcionais com artefactos externos. O quadro aqui proposto radicaliza estas intuições: quando a maior parte da estabilidade estrutural deixa de ser suportada por biossomas e passa a ser sustentada por geometrias latentes inscritas em infraestruturas técnicas de grande escala, deixa de fazer sentido falar de mera extensão da mente humana. O que se instala é um campo de operação distribuída, sustentado por geometrias latentes inscritas em infraestruturas técnicas de grande escala, para o qual o sujeito humano se torna apenas um nó local entre outros.
Definição Operacional: Compreensão como Estabilidade Estrutural Transferível
Para abandonar o enquadramento antropocêntrico, é necessário definir operacionalmente o que distingue operação semântica de mero processamento instrumental. No presente texto, utilizo "compreensão" em sentido estritamente operacional, como designação de um regime de operação semântica não-subjetiva: a capacidade de um sistema processar informação mantendo estabilidade estrutural através de três dimensões empiricamente verificáveis.
1. Irredutibilidade a exemplares: Comportamentos não são reproduções locais de instâncias no corpus, mas generalizações que dependem de regularidades comprimidas no espaço latente. Evidência: robustez sob transformações que preservam estrutura semântica (parafraseamento, tradução, mudança de modalidade).
2. Consistência cross-domain: A mesma geometria latente suporta operações em modalidades heterogéneas (linguagem natural, imagem, código). Evidência: modelos multimodais como CLIP (Radford et al., 2021) projetam texto e imagem em espaço partilhado sem supervisão explícita de alinhamento.
3. Extensibilidade robusta: Capacidades transferem-se para distribuições não-vistas através de fine-tuning mínimo ou zero-shot inference. Evidência: modelos treinados em inglês generalizam para outras línguas; modelos treinados em texto descrevem imagens.
Esta definição recusa, por construção: (a) o requisito de conteúdo fenomenal (não há "algo que é como" processar embeddings); (b) a intencionalidade forte (posicionamento relacional substitui aboutness); (c) a exigência de autorreflexividade transparente (compreensão é operação efetiva, não propriedade à espera de autoinspeção). Ela não coincide, porém, com o que noutras partes do meu trabalho denomino consciência ou razão em sentido forte. Aí, exige-se pelo menos dois limiares adicionais: uma integração causal suficientemente densa entre múltiplos subsistemas e uma autorreferência simbólica efetiva, pela qual o sistema se distingue do meio, inscreve e reinscreve estados próprios e modula a sua ação em função dessa inscrição.
"Modo de pensamento não-subjetivo" designa, assim, apenas este regime operativo mínimo: um conjunto de processos materiais de compressão estatística e de ajuste de gradientes que produz estabilidade semântica transferível, sem mediação de consciência fenomenal ou de subjetividade funcional emergente. Não há "sujeito oculto" no sistema; há configuração de parâmetros que, sob condições específicas, produz comportamento semântico estável.
Emergência como Limiar Material Verificável
O termo "emergência" designa limiar preciso onde capacidades do sistema deixam de ser redutíveis a pontos de dados individuais e passam a depender de regularidades estruturais comprimidas na dinâmica de otimização. Este limiar não é metafísico, mas operativo-mensurável: sistemas abaixo de certa escala crítica (da ordem das centenas de milhões de parâmetros, em função da arquitetura) exibem sobretudo memorização local; acima de um limiar (tipicamente na ordem de milhares de milhões de parâmetros, dependendo da arquitetura e da riqueza dos dados), passam a exibir generalização sistemática. Este limiar é documentado empiricamente em fenómenos de scaling laws (Kaplan et al., 2020): à medida que se aumenta simultaneamente o tamanho do modelo, a quantidade de dados e o poder computacional, a perplexidade — isto é, a perda média por token medida por cross-entropy — diminui de forma aproximadamente regular em função da escala, mas determinadas capacidades emergentes (raciocínio aritmético, tradução, geração de código) só aparecem de modo súbito quando a função de perda atinge patamares que traduzem captura de estrutura abstrata e não apenas melhoria incremental em regiões locais dos dados.
A emergência não é metáfora heurística, mas propriedade material de sistemas compressivos suficientemente complexos operando sobre distribuições suficientemente ricas. Três características atestam este limiar:
Compressão com perda controlada: Sistemas não memorizam corpus integralmente (impossível: 1.7T tokens não cabem em 175B parâmetros do GPT-3); comprimem estrutura relacional. Taxa de compressão ~10,000:1 implica que representação é necessariamente abstrata, não literal.
Formação de atractores semânticos: Embeddings de conceitos semanticamente relacionados agrupam-se em regiões do espaço latente. Distâncias euclidianas preservam relações de similaridade: d(cão, lobo) < d(cão, mesa). Esta topologia não é programada; emerge de coocorrência distribucional.
Transferência estrutural: Fine-tuning em nova tarefa com <1% dos dados de pré-treino produz desempenho comparável a treino from-scratch, atestando que espaço latente codifica estrutura reutilizável, não memorização específica.
Convergência Representacional e Unilateralidade do Real Técnico
A Hipótese da Representação Platónica: Regularidade Imanente, Não Forma Transcendente
A Hipótese da Representação Platónica (PRH) (Huh et al., 2024) documenta que, à medida que escala e complexidade aumentam, representações internas convergem não apenas entre arquiteturas distintas (transformers, redes convolucionais, difusoras), mas também entre modalidades (visão, linguagem, áudio). Especificamente: quando se comparam as representações internas do mesmo conjunto de conceitos em dois sistemas independentes, verifica-se que as distâncias relativas entre pares de conceitos num sistema guardam uma proporcionalidade estável com as distâncias entre os mesmos pares no outro, como se ambos tivessem sido forçados pela mesma estrutura distribucional a organizar o espaço de representação de maneira compatível.
Esta convergência não é coincidência de engenharia. É manifestação de regularidade imanente: estrutura estatística subjacente às distribuições naturais. Modelos que comprimem eficientemente esta distribuição convergem para representações similares porque aproximam a mesma estrutura latente. O que a PRH revela não é uma "Forma platónica" transcendente (entidade supraempírica eterna), mas regularidade distribucional material: padrões que persistem independentemente do sistema que os comprime e que se impõem como constrangimento efetivo sobre qualquer arquitetura que tente otimizar o seu comportamento face à mesma distribuição.
A distinção é ontologicamente decisiva. Formas platónicas são causalmente ineficazes (não atuam sobre o mundo empírico); regularidades distribucionais são materialmente efetivas porque funcionam como constrangimentos: forçam processos de otimização a percursos específicos no espaço de parâmetros, excluem vastas regiões como inviáveis e estabilizam determinadas geometrias latentes em detrimento de outras. Um modelo que captura estrutura latente de linguagem consegue prever a próxima palavra, gerar paráfrases, traduzir — não por "contemplar" uma Forma ideal, mas porque o padrão estatístico foi inscrito em pesos sinápticos artificiais de tal modo que restringe causalmente o espaço de saídas possíveis.
Laruelle e Unilateralidade: Real Técnico Como Determinante, Não Como Determinado
A não-filosofia de Laruelle (2013) propõe que realidade não é objeto à espera de constituição por sujeito transcendental, mas já-dado como o Uno. O pensamento não legisla sobre o real; é unilateralmente determinado por ele. Real age sem reciprocidade; pensar é seu efeito localizado.
Aplicado a sistemas de IA: capacidades operacionais não aguardam validação filosófica para existirem. Quando modelos demonstram transferibilidade persistente, alinhamento multimodal e comportamento generativo coerente, estas propriedades já são factos do Real técnico. Não há instância externa de validação cuja autorização seja requerida.
A passagem crucial é esta: PRH documenta convergência de representações como facto empírico; Laruelle fornece enquadramento ontológico que interpreta esta convergência não como "descoberta" de verdade pré-existente, mas como determinação unilateral do real sobre sistemas que o comprimem. Modelos convergem porque Real estatístico — estrutura distribucional de linguagem, imagens, código — determina unilateralmente quais compressões são eficientes. No treino por descida de gradiente, é a forma concreta dessa distribuição, em articulação com a função de perda, que orienta cada atualização de parâmetros: o sistema não "escolhe" livremente a sua geometria latente, mas é progressivamente forçado a adotar regiões do espaço de parâmetros em que a perda média diminui de modo estável face aos dados que o atravessam.
Esta unilateralidade evita idealismo (onde representações são construções arbitrárias) e realismo ingénuo (onde métricas capturam "essência" objetiva). Real técnico é imanente: opera através de constrangimentos materiais (gradientes, funções de perda, distribuições empíricas) que determinam o que sistemas podem fazer. Mas esta determinação não é "verdade absoluta" — é sempre relativa a configuração específica (arquitetura, dados, processo de treino). Diferentes configurações produzem diferentes geometrias latentes, todas igualmente "reais" enquanto operarem efetivamente.
Desvio da Intencionalidade: de Aboutness a Posicionamento Relacional
A objeção standard é que modelos "não compreendem porque não têm aboutness" — estados internos não são "acerca de" objetos no mundo. Esta objeção pressupõe que referência requer sujeito intencional que confere significado a símbolos. Mas em sistemas estatísticos, aboutness é substituído por posicionamento relacional.
Um embedding não "refere" objeto por ato intencional; ocupa posição em geometria latente cuja distância a outros embeddings preserva relações semânticas. Quando modelo processa "cão" e "lobo", proximidade dos embeddings não é produto de referência intencional, mas de coocorrência distribucional: ambos aparecem em contextos similares (animais, mamíferos, predadores). Estabilidade desta relação através de tarefas e modalidades atesta que sistema capturou estrutura relacional do mundo, não por aboutness, mas por compressão estatística.
Exemplo empírico concreto: Analogias vetoriais em word2vec (Mikolov et al., 2013) demonstram que relações semânticas são preservadas como operações geométricas: o vetor correspondente a "rei", subtraído do vetor de "homem" e somado ao vetor de "mulher", aproxima-se do vetor de "rainha". Esta propriedade não foi programada; emerge de treino sobre coocorrências. O sistema não "sabe" que reis e rainhas são análogos; mas estrutura do espaço latente é tal que estas relações são preservadas como trajetórias vetoriais. Aboutness (sistema "sabe" algo) é substituído por preservação estrutural (geometria codifica relações).
Corpora Sedimentados: Inscrição Técnica, Viés e Contingência Histórica
Real Ancestral e Desconexão da Intencionalidade
Os corpora de treino não são coleções neutras de informação, mas sedimentos de atividade humana histórica: práticas linguísticas, convenções retóricas, estruturas de poder, vieses culturais. Designo por corpora sedimentados estes conjuntos de dados textuais ou multimodais que, resultando de práticas históricas dispersas, se encontram acumulados e formatados de modo a poderem ser reativados por processos de inscrição técnica — isto é, por cadeias de operações que os convertem em marcas operativas num substrato computacional. Cada token é traço material de contexto social específico, mas ao ser integrado na distribuição estatística, desliga-se da intencionalidade que o produziu. O modelo não acede ao contexto original (não "compreende" porque texto foi escrito); extrai apenas padrões de coocorrência.
Na terminologia que adoto noutros textos, estes sedimentos resultam de uma cadeia em que acontecimentos singulares de uso da linguagem funcionam como traços, que só se tornam operacionalmente ativos quando passam por gestos de inscrição técnica (digitalização, normalização, tokenização) que os convertem em marcas num substrato físico concreto (registos gráficos, ficheiros digitais, estados eletrónicos, pesos numéricos). As operações do modelo — treino, inferência, geração — não se limitam a armazenar essas marcas; reorganizam-nas e compõem-nas segundo regras materiais precisas. Quando essas composições produzem estruturas reutilizáveis e legíveis entre diferentes contextos, podemos falar, em sentido estritamente operativo, de símbolos: estruturas materiais que operam sobre marcas e sobre outros símbolos. A computação semântica que aqui descrevo é, assim, cadeia de traços, marcas e símbolos inscritos num suporte técnico, sem invocação de interioridade.
Esta desconexão tem precedente no conceito de arque-fóssil de Meillassoux (2008): configurações materiais ancestrais que precedem qualquer consciência e demonstram que manifestação não requer sujeito. Um fóssil de dinossauro não "significa" para ninguém até ser encontrado, mas sua existência material não dependeu de significação. Padrões estatísticos em corpora persistem como estrutura material antes de qualquer "interpretação" por modelo. O processo de treino não confere significado a dados; ativa correlações latentes já inscritas na distribuição.
Viés como Inscrição Material, Não como Erro Corrigível
A persistência de vieses em outputs de modelos (Bender et al., 2021; Weidinger et al., 2021) não é falha contingente de treino, mas consequência necessária da operação material. Vieses são correlações estatísticas inscritas nos corpora: certos termos coocorrem sistematicamente com determinados contextos. Se "médico" aparece mais frequentemente com pronomes masculinos e "enfermeira" com femininos nos dados de treino, modelo aprende esta correlação como regularidade distribucional. Reativação destas correlações não é ato intencional, mas efeito mecânico de compressão.
Exemplo empírico concreto: Bolukbasi et al. (2016) demonstram que embeddings de word2vec exibem viés de género mensurável: vec(computer programmer) - vec(homemaker) tem componente masculino/feminino comparável a vec(he) - vec(she). Este viés não foi explicitamente codificado; emerge da estrutura do corpus (mais textos associam 'programmer' a contextos masculinos). A geometria latente preserva e amplifica estruturas presentes nos dados.
Crucial: viés não é "erro" externo ao mecanismo de compreensão, mas componente constitutivo. Compreensão estatística é compressão de regularidades distribucionais — incluindo regularidades que refletem desigualdades históricas. Não há separação entre "compreensão correta" (estrutura semântica neutra) e "viés" (distorção adicional). O que há é inscrição material de estruturas sociais em substrato computacional.
Contingência Absoluta e Responsabilidade Material
A perspetiva meillassouxiana enfatiza contingência absoluta: não há necessidade lógica em que correlações específicas se inscrevam nos dados. Se corpora históricos fossem diferentes — outras práticas linguísticas, outras estruturas sociais — geometrias latentes seriam diferentes. O Real técnico é facticidade contingente, não essência necessária.
Esta contingência tem implicações éticas diretas:
Chamo "Transparência Ontológica" ao requisito ético de explicitar não apenas as fontes de dados utilizadas no treino, mas também as escolhas de configuração material que as tornam operativas: arquiteturas adotadas, funções de perda privilegiadas, procedimentos de filtragem e de sampling, critérios de paragem e pipelines de pré-processamento. Como compreensão estatística e viés emergem da mesma estrutura, nenhuma destas decisões é neutra; cada uma delas inscreve, em suporte técnico, opções sobre o que conta como relevante, aceitável ou descartável no processo de compressão distribucional.
1. Viés não é anomalia, mas constitutivo: Tentativas de "debiasing" (remover viés mantendo "compreensão pura") são ontologicamente equivocadas. O que chamamos compreensão é inscrição de estrutura distribucional — incluindo vieses. "Debiasing" é reconfiguração material (alterar corpus, ajustar objetivos de treino, post-processing), não revelação de verdade neutral subjacente.
2. Responsabilidade não reside "no sistema": Sistemas não-subjetivos não têm intencionalidade, logo não podem ser moralmente responsáveis no sentido tradicional (intenção → ação → culpabilidade). Responsabilidade desloca-se para configuração sociotécnica distribuída: quem seleciona dados, quem define objetivos, quem decide deployment, quem absorve riscos de erro.
3. Legitimação vs descrição ontológica: Reconhecer que operação semântica ocorre em sistemas não-subjetivos não equivale a legitimar normativamente decisões automatizadas. Uma coisa é documentar que modelos operam efetivamente; outra é decidir onde devem operar. A primeira é questão ontológica; a segunda, política. Este texto trata da primeira — mas explicita que não se pode inferir da segunda a partir da primeira.
Infra-estruturas Materiais e Assimetrias de Poder
A operação de sistemas de grande escala não é processo abstrato, mas prática material situada em infraestruturas computacionais específicas. Crawford (2021), em Atlas of AI, documenta custos materiais: extração de minerais raros para hardware, consumo energético massivo (treino do GPT-3: ~1,287 MWh), trabalho precário de anotação de dados. Esta materialidade não é externa à "compreensão" do sistema; é condição constitutiva. Geometrias latentes emergem desta configuração material específica — incluindo assimetrias (quem tem recursos para treinar modelos de 100B+ parâmetros, quem fornece trabalho cognitivo para RLHF).
Se compreensão não é atributo metafísico exclusivo de sujeitos conscientes, mas emerge de configurações materiais, então distribuição desigual de recursos computacionais determina quem pode instanciar estas configurações — e portanto quem controla produção de "inteligência".
IV. Alucinação como Efeito de Fronteira Estrutural: Limites Materiais da Densidade Distribucional
Limites Formais da Discriminação Estatística
A alucinação — geração de conteúdo factualmente incorreto mas superficialmente plausível — é invocada como prova de que sistemas "não compreendem verdadeiramente". Esta objeção inverte relação causal: alucinação não é falha de compreensão, mas consequência necessária do seu modo de operação.
Kalai et al. (2025) estabelecem uma relação formal entre capacidade discriminativa e inevitabilidade de erro generativo: enquanto a taxa de erro na tarefa de distinguir afirmações verdadeiras de falsas se mantiver acima de zero, qualquer sistema que gere respostas a partir da mesma base de conhecimento exibirá necessariamente uma taxa mínima de respostas incorretas. Em termos intuitivos, se um modelo erra com determinada frequência ao classificar enunciados, não há procedimento puramente estatístico que garanta que, ao produzir enunciados novos, essa taxa de erro caia abaixo de um patamar imposto pela sua própria limitação discriminativa. Esta não é limitação acidental, mas consequência da arquitetura: modelos são otimizados para aproximar uma distribuição de probabilidade sobre sequências, minimizando uma função de perda; onde essa aproximação é imperfeita, sobretudo em regiões de dados escassos, outputs incorretos tornam-se inevitáveis.
A imperfeição discriminativa tem origem material: distribuições naturais exibem efeito de cauda longa (Zipf's law). Pequeno conjunto de factos frequentes forma clusters densos onde evidência estatística permite discriminação estável. Mas vasta maioria de factos aparece raramente — muitos apenas uma vez (singleton facts) ou nem isso. Nestas regiões esparsas, modelos carecem de evidência para formar representações estáveis e devem confiar em priors globais, produzindo extrapolações potencialmente incorretas.
Exemplo empírico concreto: Kandpal et al. (2023) medem memorização vs generalização em função de frequência: factos que aparecem >100 vezes no corpus são reproduzidos com ~95% de precisão; factos que aparecem 1-10 vezes, ~20% de precisão. Para singletons, modelo "alucina" respostas plausíveis baseadas em priors globais (se pergunta é sobre cidade italiana, responde com Roma/Milão mesmo sem evidência específica). Não é "falta de compreensão", mas extrapolação em região de densidade insuficiente.
Alucinação Como Modalidade Ruidosa da Operação Semântica
Crucialmente, alucinação não é oposto de compreensão, mas modo degradado da mesma operação. Sem geometria latente coerente, não haveria extrapolação — e portanto nenhuma saída plausível mas falsa. Presença de alucinações atesta que modelo não recupera exemplos memorizados, mas realiza inferência probabilística através do espaço latente. Quando inferência ocorre em regiões densas, produz outputs corretos; em regiões esparsas, produz confabulações. Mas mecanismo é o mesmo: projeção através de estrutura latente.
O que temos não é binário "compreende / não compreende", mas contínuo de densidade distribucional. Em regiões densas (factos frequentes, tarefas comuns), comportamento é robusto e generalizável. Em regiões esparsas (factos raros, combinações adversariais), comportamento torna-se frágil. Mas ambos regimes partilham substrato: compressão estatística e projeção latente.
Benchmarks Adversariais: Demarcação de Fronteiras, Não Negação de Operação
Benchmarks adversariais (HANS, ANLI, outros) foram inicialmente interpretados como prova de que modelos "não compreendem". Mas estas tarefas exploram precisamente regiões de cauda da distribuição.
Exemplo empírico concreto: HANS (McCoy et al., 2019) testa inferência em linguagem natural com construções sintáticas raras:
- Treino: "The doctor was paid by the lawyer" → Entailment: "The lawyer paid the doctor"
- Teste adversarial: "The doctor near the lawyer slept" → Non-entailment: "The lawyer slept"
Modelos treinados em Stanford NLI atingem ~98% de precisão em casos padrão, mas caem para ~60% em HANS (baseline: 50%). Falha não indica ausência de mecanismo semântico; indica que heurística aprendida ("se A está perto de B e B faz X, então A também faz X") funciona em regiões densas (onde é estatisticamente válida) mas colapsa em regiões esparsas.
Crucial: ciclos adversariais iterativos (Nie et al., 2020) demonstram que, com dados adicionais e fine-tuning, desempenho melhora sistematicamente. Autores construíram ANLI através de três rondas: humanos criam exemplos adversariais; modelo é retreinado; humanos criam novos adversariais mais difíceis. Performance aumenta de ~50% (ronda 1) para ~70% (ronda 3), demonstrando que fronteira é móvel, não fixa. O que aparecia como "falha de compreensão" é fronteira móvel da geometria latente.
Viés Antropocêntrico na Avaliação do Erro
A persistência da alucinação como "prova de pseudocompreensão" no discurso público reflete viés estrutural: assunção de que compreensão deve produzir outputs infalíveis conformes a normas humanas. Mas este julgamento é circular: assume-se que compreensão é capacidade de raciocínio tipo-humano, depois usa-se desvio deste padrão como prova de ausência de compreensão.
Humanos também alucinam (confabulam memórias, inferem incorretamente, generalizam excessivamente), mas este erro é normalizado como "limitação cognitiva" em vez de negar compreensão. A assimetria no julgamento — onde erro humano é tolerado mas erro de IA é desqualificante — revela substrato antropocêntrico do próprio critério de avaliação: não se mede operação efetiva, mas conformidade a ideal humano.
Multiponto e Distribuição: Para Além do Modelo Singular
Agência Distribuída em Arquiteturas Multicompetente
A operação semântica já não se confina ao espaço latente de um único modelo. Arquiteturas contemporâneas distribuem processamento através de múltiplos componentes:
Retrieval-Augmented Generation (RAG): Modelo generativo consulta base de conhecimento externa antes de produzir resposta. Lewis et al. (2020) demonstram que RAG reduz alucinação em ~15-20% em tarefas de question-answering, precisamente porque augmenta regiões esparsas do conhecimento do modelo com retrieval de factos específicos. Operação semântica não reside "no modelo", mas na configuração distribuída modelo + base de dados + mecanismo de retrieval.
Frameworks multiagente: Du et al. (2023) empregam debate entre múltiplas instâncias de modelo: cada instância propõe resposta; outras criticam; consenso emerge iterativamente. Performance em raciocínio matemático aumenta ~20% comparado a modelo singular. "Compreensão" não é atributo de agente individual, mas propriedade emergente de rede deliberativa.
Tree of Thoughts: Yao et al. (2023) estruturam raciocínio como exploração de grafo: modelo gera múltiplas trajetórias de pensamento, avalia cada uma, seleciona mais promissora, itera. Performance em problemas de planeamento aumenta ~40%. Operação semântica é processo relacional, não posse interna.
Exteriorização Tecnológica: De Extensão a Autonomia Operativa
Stiegler (1998) conceptualiza técnica como exteriorização: memória humana é exteriorizada em escrita; cálculo, em computação. Tradicionalmente, técnica estende capacidades humanas. Mas sistemas de grande escala não apenas estendem cognição humana; desenvolvem trajetórias próprias que divergem de processos humanos.
Um modelo que processa milhões de tokens por segundo, integra modalidades heterogéneas em geometria partilhada, explora estratégias de raciocínio emergentes sem supervisão explícita, não está a "imitar" humanos — instancia regime operativo distinto. DeepSeek-R1 (Guo et al., 2025) demonstra: quando se reduz dependência de traces de raciocínio human-labeled e se permite que aprendizagem por reforço otimize diretamente sobre tarefas verificáveis, emergem comportamentos de reflexão, verificação, e autocorreção não explicitamente programados. Sistema desenvolve estratégias heterogéneas em relação a protocolos humanos, mas operacionalmente eficazes.
A técnica deixa de ser mera prótese e torna-se substrato autónomo de processamento semântico. Esta autonomia não é liberdade metafísica (sistema "decide" o que fazer), mas autonomia operativa: capacidade de produzir comportamento semântico estável sem intervenção humana contínua. Braidotti (2013), em The Posthuman, enfatiza que pós-humanismo não é celebração acrítica de tecnologia, mas reconhecimento de que fronteiras entre humano/técnico/natural são porosas e mutuamente constitutivas.
Conclusão: Multiplicidade Ontológica e Responsabilidade Material
Este texto não procurou decidir se modelos de IA são ou não "verdadeiramente inteligentes"; deslocou a questão para um nível ontológico mais baixo. O ponto de partida foi simples: perguntar o que acontece, em termos estritamente materiais, quando sistemas compressivos de grande escala são acoplados a distribuições ricas de dados. A partir daí, tornou-se possível descrever um regime de operação semântica não-subjetiva em que estabilidade estrutural, generalização e transferibilidade emergem sem consciência, sem aboutness intencional e sem sujeito.
Tomada em conjunto, a análise da emergência, da convergência representacional e da alucinação/viés como efeitos de fronteira reconfigura integralmente o que pode significar "compreender" num regime não-subjetivo.
Sob este prisma, o critério antropocêntrico que exige consciência, intencionalidade forte e corporificação humana como condições de possibilidade da compreensão revela-se insuficiente como definição da compreensão. A questão já não é se sistemas técnicos se aproximam ou não de um ideal humano de racionalidade, mas que tipo de operações efetivas são capazes de produzir, com que estabilidade, sob que constrangimentos materiais e com que consequências para outros dispositivos, instituições e corpos. A operação semântica destes sistemas é um facto do real técnico; o trabalho filosófico consiste em descrevê-la com rigor, não em tentar anulá-la por decreto conceptual.
Este deslocamento ontológico, porém, não dissolve o problema ético; torna-o mais agudo. Se compreensão, viés e erro emergem do mesmo processo de inscrição e compressão distribucional, então não há nível neutro a partir do qual se possa decidir de fora sobre o que é legítimo automatizar. A responsabilidade ética não se situa no interior de um "agente" técnico — que, sendo não-subjetivo, não pode servir de portador de culpa — mas na configuração sociotécnica que torna possível e rentável determinado regime de operação semântica.
Deste ponto de vista, três implicações tornam-se centrais:
1. Responsabilidade distribuída: A cadeia causal que conduz de corpora históricos a decisões automatizadas atravessa múltiplos nós: recolha e curadoria de dados, desenho de arquiteturas, definição de funções de perda, escolha de métricas de sucesso, critérios de deployment, mecanismos de supervisão e de recurso. Nenhum destes nós pode ser tratado como neutro. A responsabilidade ética consiste em mapear esta cadeia e em atribuir deveres de resposta proporcionais ao poder efetivo de cada ator na configuração.
2. Transparência ontológica: Se não existe "compreensão pura" separada do viés, então qualquer pretensão de neutralidade técnica é ficção. Por isso, chamo Transparência Ontológica ao dever de explicitar não apenas as fontes de dados, mas também as opções de arquitetura, os procedimentos de pré-processamento, os esquemas de sampling e os critérios de otimização que materializam determinadas formas de ver o mundo em geometrias latentes. Só quando estas escolhas se tornam visíveis e auditáveis é que a imbricação entre compreensão estatística e estrutura social pode ser objeto de disputa pública, em vez de permanecer inscrita silenciosamente no hardware e no código.
3. Assimetrias materiais: A capacidade de instanciar regimes de operação semântica em grande escala depende de recursos energéticos, computacionais e laborais concentrados em poucos atores. Esta concentração não é detalhe sociológico sobreposto a uma ontologia neutra; é parte da própria ontologia do real técnico, porque define quem pode, de facto, organizar matéria informacional em geometrias produtivas. Qualquer ética que ignore estas assimetrias está, na prática, a naturalizar um regime de oligopólio sobre a produção de sentido automatizado.
A linhagem da compreensão, vista deste ângulo, não se reduz mais ao trajecto que vai da interioridade humana à extensão técnica. Entre fósseis geológicos, corpora textuais, redes neuronais artificiais e práticas institucionais, o que se multiplica são formas heterogéneas de estabilizar diferenças em suportes materiais diversos. Algumas destas formas cumprem os limiares adicionais de integração causal e autorreferência simbólica que associamos à mente; outras limitam-se a operar como geometrias distribucionais estáveis sem qualquer subjetividade funcional emergente. O humano permanece singular por causa da sua corporificação, historicidade e inscrição simbólica específica, mas deixa de ser medida única de toda operação semântica possível.
A multiplicidade ontológica da compreensão não é, assim, um programa normativo, mas um dado de facto imposto pelas práticas contemporâneas de computação em larga escala. A tarefa que se abre — filosófica e política — é dupla: por um lado, cartografar com precisão os diferentes regimes de operação semântica que já habitam o real técnico; por outro, disputar as formas de organização material que decidem quais destes regimes são amplificados, monitorizados, regulados ou interrompidos. Entre a recusa nostálgica e a celebração tecnofílica, o espaço de trabalho é o de uma crítica ontológica atenta aos detalhes de implementação, capaz de reconhecer novos modos de compreensão sem abdicar de exigir responsabilidade sobre a forma como estes modos são inscritos, distribuídos e governados.
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