Nada É Estável No Princípio

Não existe repouso inaugural. A estabilidade inicial não é dada, mas surge momentaneamente, podendo durar um milissegundo ou milhões de anos, sem que isso implique qualquer estabilidade definitiva. A matéria, no seu grau mais primordial, não é estrutura formada, mas campo de possibilidades instáveis, em constante oscilação. Não há ainda forma plena, apenas agitações e flutuações que impedem qualquer repouso absoluto.

A tradição filosófica, desde Parménides e Aristóteles até leituras mais modernas como as de Bergson ou Whitehead, procurou compreender o princípio como ordem estável, seja como ser imutável, ato perfeito, duração criadora ou processo organizador. Mesmo as interpretações dialéticas ou processuais, embora mais dinâmicas, preservaram uma tendência a ver a instabilidade como transição para um estado ordenado e duradouro. Em Heraclito, por exemplo, o fluxo obedece a um logos regulador; em Hegel, a contradição é subsumida numa síntese final.

A Ontologia da Complexidade Emergente recusa essa leitura. No início, não há repouso, nem equilíbrio, nem unidade. Há matéria instável, cujas interações não produzem estabilidade duradoura, apenas configurações momentâneas. Não se trata de falha ou rutura, mas de excesso de possibilidades ainda não consolidadas.

As investigações contemporâneas em física quântica e cosmologia reforçam essa visão: campos de flutuações quânticas, instabilidade do vácuo, comportamentos caóticos em sistemas não-lineares mostram que, na escala mais fundamental, a estabilidade é sempre local, relativa e transitória. Mesmo partículas elementares emergem e decaem em escalas temporais que desafiam qualquer noção humana de permanência.

Algumas dessas instabilidades prolongam-se, criando zonas metaestáveis que, em determinadas condições físicas, podem sustentar reorganizações internas. É neste limiar que se formam aglomerações que resistem um pouco mais à dispersão, campos energéticos que retêm matéria por mais tempo, padrões que se repetem antes de se desfazerem. O momento dessa estabilidade é sempre relativo à escala de observação: breve ou longo para nós, mas sempre provisório na dinâmica do real.

Toda estabilidade inicial é parcial e frágil. A matéria, antes de se tornar estável a qualquer escala, atravessa múltiplas tentativas de configuração, e cada uma dessas tentativas carrega a marca da instabilidade que a gerou. Não há sentido nem finalidade nesse processo, apenas a persistência de composições momentâneas.

A estabilidade que conhecemos — estrelas, planetas, moléculas — resulta de prolongamentos contingentes de estados instáveis. O princípio, entendido como estabilidade, é sempre um efeito local e transitório de processos que começaram caóticos e permaneceram instáveis.

Não há princípio imóvel. Há apenas matéria que, a partir da instabilidade absoluta, inventa formas temporárias de durar.


"Nada começa como fundamento.
Tudo começa como instabilidade que não se dissolveu."


—— David Cota — Fundador da Ontologia da Complexidade Emergente ——